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22 de jul. de 2016

Elaborando um Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PNRS) para sua empresa ou residência

Auxiliando meu condomínio aqui no centro da cidade de São Paulo na montagem de um Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS), decidi compartilhar o texto elaborado com vocês.
Produzimos muito resíduo, o equivalente a 215 mil toneladas por dia
Informação amplamente disseminada, a maior parte das coisas descartadas como lixo podem ser reaproveitadas nos dias de hoje. E embora muitas delas ainda sejam tratadas como rejeitos, na verdade trata-se de resíduos erroneamente descartados. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, rejeito é o que não é passível de reaproveitamento. Em contrapartida, os resíduos podem ser reaproveitados ou reciclados, sendo considerados matéria-prima para outras empresas.
Em 2014, cada cidadão brasileiro produziu mais de 1 kg de resíduo sólido urbano (RSU) por dia. Somando a geração de todos nós, foram 215 mil toneladas (ABRELPE, 2015). No mesmo ano, a média diária de coleta foi de apenas 195 mil toneladas. Isto quer dizer que a cada dia aproximadamente 20 mil toneladas de RSU possuem um destino desconhecido, provavelmente lançadas no oceano e corpos d'água, depositados em área de mata nativa, queimadas ou enterradas nos fundos das residências.
Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010)
Para corrigir essas e outras distorções, de modo a melhorar essa situação e direcionar toda a sociedade para as melhores práticas de destinação correta dos resíduos gerados em suas práticas cotidianas e atividades produtivas e comerciais, foi criada a Lei nº 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
Ela contém princípios, objetivos e diretrizes para a gestão e o gerenciamento de resíduos sólidos no Brasil e é aplicável a todas as pessoas e empresas responsáveis por geração de resíduos sólidos, criando um mecanismo de responsabilidade compartilhada em relação a tudo o que é produzido, consumido, e descartado no meio ambiente.
Dessa forma, a Lei institui a responsabilidade compartilhada de fabricantes, distribuidores, varejistas, consumidores e governos sobre o descarte de produtos e mercadorias comercializados, e exige que todas as prefeituras e estados estabeleçam um Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos. A observação de suas diretrizes e cumprimento de prazos é realizada pelo Ministério do Meio Ambiente.
Responsabilidade compartilhada
A responsabilidade compartilhada da PNRS exige o compromisso de que todas as empresas, poder público e consumidores em contato com o produto ao longo de sua produção e consumo realizem o seu correto descarte. Ela tem como objetivos compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais, promover o aproveitamento de resíduos sólidos, reduzir seu desperdício e incentivar boas práticas de responsabilidade socioambiental.
O Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (SINIR) é um dos instrumentos da PNRS e parte do compromisso do Ministério do Meio Ambiente em agrupar dados que colaborem com o monitoramento do tratamento dos resíduos no Brasil. Para saber mais acesse: www.sinir.gov.br.
Entre as diretrizes da PNRS de responsabilidade direta dos municípios está a do “encerramento dos lixões”, locais que passariam a receber unicamente rejeitos, e não resíduos reaproveitáveis propriamente dito. Tais lixões são espaços a céu aberto sem nenhuma preparação para receber adequadamente os resíduos ali lançados, levando a graves danos, tais como a contaminação do solo e das águas subterrâneas pelo chorume; contaminação da atmosfera por meio da emissão de gases poluentes; além do acúmulo de insetos transmissores de diversas doenças.
Mesmo após a extensão do prazo para a extinção dos lixões, em Agosto de 2014, ainda existem milhões de lixões espalhados pelo Brasil. Acabar com eles requer um esforço não só ambiental e governamental, mas fundamentalmente social. Muitas famílias ainda vivem e retiram dos lixões seu sustento diário, uma problema seríssimo para toda nossa sociedade.
Hierarquia em ações
Devido ao alto número de soluções possíveis de destinação correta de resíduos sólidos, a PNRS estabelece um critério de priorização de ações, a chamada hierarquia na gestão, para que cada indivíduo possa identificar suas melhores opções de conduta:
Tabela 1 – Priorização das ações para consumo e utilização de produtos e serviços
 Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS)
Para que cada um dos atores (indivíduos, empresas, condomínios, governos) envolvidos planeje suas ações em relação à PNRS, é necessário que cada qual desenvolva seu próprio Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS), que deve abordar, fundamentalmente, as etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos por ele descartados.
Dessa maneira, o PGRS torna-se uma ferramenta eficiente para aprimorar a forma de gerir os processos de destinação dos resíduos gerados, pois inclui detalhes de planejamento, operação e registros de cada etapa.
Modelo de PGRS
O Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos pode ser criado com o uso de uma simples tabela. Para cada coluna, um resíduo. Nas linhas, informações necessárias para o seu gerenciamento. A título de exemplo, selecionaram-se dois tipos de resíduos utilizados em algumas indústrias de transformação, que levou à elaboração do PGRS abaixo.
Tabela 2 – Modelo de Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos
Depois de analisar o quadro abaixo, que tal verificar se consegue elaborar um pra você, sua família e seus funcionários. Basta pegar uma cartolina, algumas canetas coloridas, usar a criatividade, e começar a tratar seus resíduos adequadamente.
 Lembre-se de atuar em parceria com seus vizinhos e sua comunidade, além de contar com o apoio de empresas de limpeza pública e resíduos especiais, cooperativas de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, e claro, de excelentes iniciativas de empresas públicas e privadas que montaram pontos de coleta para facilitar o seu descarte. Boa sorte e depois me conta como ficou!
Últimas dicas:
Resíduos secos podem ser destinados corretamente para pontos de coleta ou reciclagem. Pesquise o ponto de coleta mais próximo do seu condomínio ou estabelecimento comercial e inicie um plano para destinação correta desses resíduos. Acesse: http://www.centraldareciclagem.org/ .
 Para quem vive na cidade de São Paulo, vale a pena conferir sobre o Programa de Coleta Seletiva da cidade pelo link:http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/servicos/amlurb/coleta_seletiva/index.php?p=4623  
Bibliografia:
ABRELPE - Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais. Panorama dos resíduos sólidos no Brasil – 2015.
PNRS - Política Nacional de Resíduos Sólidos ( Lei 12.305 de 2 de agosto de 2010).

20 de jul. de 2016

Transistória e o capitalismo bastardo no Brasil

O padrão de consumo acumulativo que conhecemos e predomina ainda hoje teve suas raízes na segunda fase da Revolução Industrial, a partir da segunda metade do século XIX, quando o processo de acumulação de capital e o fluxo do comércio internacional de mercadorias expandiram-se com base na estrutura dos novos modelos econômicos, impulsionados pelo boom da máquina a vapor.
Aos blocos das economias que lideraram o processo de industrialização e que formavam os sistemas econômicos nacionais (Inglaterra, Alemnha e EUA) atribuiu-se a responsabilidade de promover a implantação de um sistema de divisão internacional do trabalho que marcaria definitivamente a evolução do capitalismo mundial.
Com origem nas estruturas dualistas formadas a partir do advento do núcleo industrial capitalista no século XIX entre centro e periferia mundial, incluindo o Brasil e a Amérca Latina, o fenômeno do subdesenvolvimento surgiu como um processo histórico autônomo, uma peculiaridade, e não uma etapa pela qual um país precisa passar para alcançar o desenvolvimento.
Ao passo que novos investimentos eram feitos em uma região, mesmo sem a existência de vínculos locais – levando ao vazamento do excedente ao exterior –, e servindo à contratação de mão-de-obra não especializada frente a maior produtividade do fator trabalho e do aumento do progresso técnico em curso, a coexistência entre economias capitalistas e pré-capitalistas ocorreu de forma pacífica. As regiões subdesenvolvidas, nesse caso, assumiram a forma bastarda de capitalismo, ou, simplesmente “capitalismo bastardo” (Furtado, 1978).
Filho Bastardo – Adriana Varejão
Além da existência de um excedente quase que infinitamente disponível de mão-de-obra no setor pré-capitalista para ser empregada no setor capitalista, com base na oferta de um salário real em nível marginalmente acima do nível de subsistência, o fenômeno do subdesenvolvimento apresenta-se, acima de tudo, como um processo de dominação cultural e política, no qual o consumo das minorias mais favorecidas é estabelecido com base na importação de bens e nos padrões culturais integrados aos subsistemas dominantes, ou o mesmo que Furtado chamou de “enclave” social.
A falta de autonomia nas decisões de um Estado nacional interventor, no sentido de orientar a reprodução do capital nos setores industriais mais avançados e neles estimular o aperfeiçoamento da mão-de-obra especializada, projeta o caráter dualista do subdesenvolvimento, em permanente condição de dependência em relação ao padrão de divisão internacional do trabalho estabelecido pelos países que lideraram o processo da Revolução Industrial, inclusive se pensarmos a quinta onda da Revolução Industrial ocorrida nos anos 2000, a das TICs.
Tal disparidade leva, entre outras, à marginalização permanente das estruturas sociais, ao aumento da concentração de renda, e à deterioração no longo prazo dos termos de intercâmbio dos países especializados em matéria-prima, que assumem pacificamente o retorno à condição de fazenda do mundo, diante de economias que estão na crista da inovação.
Se as complexas relações de dominação e dependência características do subdesenvolvimento podem ser rompidas, isso depende do interesse da governança envolvida com o desenvolvimento da economia brasileira rumo à sua modernização, com elevação da renda per capita aos níveis internacionais, e com base no conjunto formado por industrialização de vanguarda, aumento da mão-de-obra especializada ocupada, acesso a mercados externos e a intervenção do Estado na coordenação dessa orquestra.
Bibliografia:
FURTADO, C. Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico. Paz e Terra, São Paulo, 1978, 10ª. ed. Cap. 8 e 13 a 22.

4 de jul. de 2016

Desequilíbrio monetário no Brasil (parte 3 - o poder do atraso)

Vinte anos após um período de estabilidade monetária no Brasil, a estratégia de alternância baseada ora em taxas de juros elevadas, ora em taxas de cambio valorizadas para o controle da inflação, se exitosa no seu objetivo central, levanta controvérsias no que toca ao êxito das suas medidas, especialmente aos reflexos negativos da valorização cambial e dos juros altos para a modernização da estrutura produtiva do país, se comparado a outras economias mundiais.
Agrupando-se no Gráfico 1, a seguir, a evolução das trajetórias da taxa de câmbio em relação ao Dólar americano e da taxa de juros nominal (Selic), ambas com fechamento em 31/12 de cada ano selecionado entre 1999 (início do sistema de metas de inflação) e 2015, é possível verificar que a cada movimento de desvalorização cambial (2002, 2008 e 2015) - que buscara restabelecer a competitividade nacional - correspondiam elevações na trajetória da Selic - justamente realizando o movimento contrário, de contração da atividade econômica -, mesmo estando a Selic em trajetória declinante.
Gráfico 1 - Evolução da trajetória da taxa de câmbio (US$ : R$) e da taxa de juros (Selic) - em 31/12














Fonte: BCB. Elaboração do autor
Se por um lado voltamos a ter os preços básicos controlados e amparado neste modelo, conforme verificado na primeira parte e segunda parte dessa série, alguns indicadores, como grau de industrialização, que mede o nível de nacionalização da produção local, ou valor criado no país em relação à produção doméstica, nunca foi tão baixo (Gráfico 2). De modo geral, com menor grau de industrialização, não apenas menos empregos e renda são potencialmente criados e distribuídos. Também são menores, nessa situação, os investimentos em pesquisa e inovação em setores estratégicos, tornando o país ainda mais atrasado, pobre e dependente das novidades internacionais que parece não conseguir produzir por aqui. Tomando como o princípio o fenômeno da causação circular, “o processo acumulativo, quando não controlado, promoverá desigualdades crescentes” (MYRDAL, 1960, p. 27).
Gráfico 2 - Participação do Valor Adicionado da Indústria de Transformação em relação ao Valor Adicionado Total: 1995 a 2015 (em %).


















Fonte: IBGE. Elaboração do autor.
Sem ter a intenção de sair em defesa do processo inflacionário, que ao corroer os preços das mercadorias reduz o poder de compra do consumidor, a dobradinha baseada na valorização artificial do Real frente ao Dólar e na elevação da Selic para o controle inflacionário tende ao esgotamento, isto se pensarmos na tentativa de modernização econômica do país. Mantido esse quadro, ainda que com inflação sob controle, o Brasil como sociedade seguirá amargando o “poder do atraso” (Martins, 1994) em relação a outros mercados mundiais, sem aproveitar o potencial que aqui existe para conjugar novas perspectivas de rendimento produtivo, emprego e capacitação profissional, especialmente em setores estratégicos e oferendo oportunidades àqueles que mais necessitam.
O poder do atraso, contudo, não significa apenas a substituição da produção nacional por similares importados. Trata-se, na verdade, da perda da referência do país em relação às suas potencialidades locais e à sua inserção internacional, fato agravado pelo enfraquecimento da autonomia e da capacidade indutora do Estado nacional, da ausência de políticas de competitividade, pela quebra e desnacionalização das cadeias produtivas nacionais e, fundamentalmente, pela reprimarização da pauta exportadora, tudo conforme se conhece desde séculos atrás. 
Bibliografia:
BCB – BANCO CENTRAL DO BRASIL. Taxas de câmbio. Brasília: BCB, on line, 2016. 
_________. Taxa de juros - Selic: Brasília: BCB, online, 2016.
LACERDA, Antônio Correa. Dissintonia das políticas macroeconômicas adia saída da crise. Brasil Debate . Disponível em: http://plataformapoliticasocial.com.br/artigo-23-dissintonia-das-politicas-macroeconomicas-adia-a-saida-da-crise/  . Acesso em 17/07/2016. 
MARTINS, José de Souza. O poder do atraso. São Paulo: Hucitec, 1994. 
MYRDAL, G. Teoria econômica e regiões subdesenvolvidas. Primeira edição. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura: Instituto superior de estudos brasileiros, 1960.