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13 de jun. de 2016

Desequilíbrio monetário no Brasil (parte 2- nem vem que não tem)

Vinte anos se passaram, ao menos, sem o bicho-papão da inflação no Brasil. A média do indicador geral de preços (IPCA) calculada entre os anos 1996-2015 foi de 6,7% ao ano (Gráfico 1), comparado aos 22,4% a.a. registrados em 1995, 12,5% a.a. em 2002 e 10,7 a.a. de 2015. A título de curiosidade, a inflação nos anos de 1993 e 1994 registrou 2.477% a.a. e 916% a.a. respectivamente. Com base nesses dados, como afirmar haver inflação galopante em curso no país?

Gráfico 1 – Evolução da trajetória do IPCA, média, meta e expectativa – em % ao ano

Fonte: IBGE; BCB 

Desde 1999 a base da política monetária no Brasil tornou-se orientada pelo chamado "sistema de metas de inflação", que consiste na determinação prévia de qual deve ser o intervalo de tolerância da inflação esperada para os dois próximos anos subsequentes (linha tracejada laranja), uma espécie de guia para auxiliar o controle dos preços no país. No caso brasileiro, sua adoção representou, por um lado, um avanço para a estabilidade macroeconômica do país, levando ao balanceamento das Contas Nacionais, especialmente ao equilíbrio monetário no país. 

Estipulada anualmente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Banco Central do Brasil (Bacen), a meta de inflação não tem sido alterada desde 2007, permanecendo no patamar de 4,5% a.a. até 2017. Nos anos anteriores esse valor não se alterou consideravelmente, sendo o mais alto o de 8% a.a. estipulado para o ano 1999.  Nota-se assim que apesar da meta, raras foram as vezes que o IPCA registrou exatamente os valores pretendidos, exceção feita aos anos 2000, 2007 e 2009 Na maior parte dos outros anos da série analisada, porém, a inflação registrou valores pouco acima da meta prevista, sem com isso suscitar qualquer risco de descontrole inflacionário. 

Com relação ao ano 2015, como explicado no post Desequilíbrio monetário no Brasil (parte 1 - nem aqui nem na China), sua elevação bastante acima do patamar de 4,5% a.a. da meta estipulada para este ano tem sua resposta na correção dos preços administrados que não era reajustado a anos, sobretudo os da energia, e da forte desvalorização cambial" (DEPE, 2015). Sem a perspectiva de novos ajustes desse tipo, a expectativa inflacionária divulgada pelo Boletim Focus do Bacen para os anos 2016 e 2017 é de 7,1% a.a. e 5,5% a.a., respectivamente, retornando a níveis próximos aos da meta de inflação estipuladas para esses anos.

Sem risco iminente do retorno ao bicho papão da inflação, como muitos globais insistem em divulgar, o risco desse modelo diz respeito à dependência da elevação sistemática da taxa básica de juros brasileira, que ao seguir como a mais elevada do mundo, atrai capitais especulativos de toda ordem, elevando o custo da dívida pública no Brasil (Tabela 1). Segundo Belluzzo e Galípolo (2016), "o déficit primário acumulado [2015] foi de 143,7 bilhões de reais, enquanto o crescimento da dívida bruta foi de 675 bilhões. Essa dinâmica é indecifrável sem a análise das despesas com juros da dívida pública, que saltam de 32,2 bilhões em 1994 para o mais de 502 bilhões em 2015".

Tabela 1 – Inflação, Taxa de juros nominal e real em países selecionados (2016 até fevereiro) – em % a.a.

*Em % ao ano. Dados de juros atualizados até fevereiro de 2016.
**Inflação acumulada em 12 meses. Para Índia referente a janeiro de 2016 e para os demais países referente a fevereiro de 2016.
Fonte: OECD ; BCB; IBGE 

Considerando-se as taxas reais de juros vigentes em Fevereiro de 2016, o Brasil foi de longe o pais com maior taxa real de juros (3,5% a.a), ante 2,7% a.a. na Rússia, 2,5% a.a. na Indonésia e 2,0% a.a. na China. No mesmo período Índia e México registraram taxas reais de juros de 0,8% a.a., enquanto que algumas economias como Turquia, Canadá, EUA, Japão e África do Sul registraram taxas reais negativas de respectivamente -1,2% a.a., -0,9% a.a., -0,5% a.a., -0,4% a.a. e -0,2% a.a..

Prestes a esgotar-se, Lacerda considera, ainda, que o sistema de metas de inflação é ruim (2016). Para o autor: "combater a inflação para valer passa por diversos pontos. Precisamos estimular a concorrência, porque temos muitos setores oligopolizados, com grande poder de formação de preços. Temos de enfrentar a indexação, que gera inflação inercial. Também é necessário rever o sistema de metas, aperfeiçoando-o com as melhores práticas internacionais"(LACERDA, 14/05/2016).

Com efeitos estruturais já declarados (preços administrados e desvalorização cambial), a inflação não tem nada a ver com a demanda, senão que com os cartéis de preços formados por oligopólios setoriais que se gabam pela falta de concorrência aos produtos da sua cadeia de valor. Tais são os casos de empresas do varejo, como supermercados, da indústria alimentícia, como do corte de carnes, bem como da construção civil, indústria automobilística, entre tantas outras. Aos midiáticos de plantão, não vem que não tem. A demanda segue caindo e os juros altos só aumentando a recessão.


Bibliografia:
BELLUZZO, Luiz G & GALÍPOLO, Gabriel. Meias verdades sobre a crise e o Brasil: no pós-impeachment do sufrágio universal, a sociedade não cabe no orçamento, dizem os socialites. Economia. Carta CapitalOn line, 2016. Disponível em <http://www.cartacapital.com.br/revista/902/meias-verdades>. Acesso em 25/05/2016.  
DEPE – GRUPO DE PESQUISA EM DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E POLÍTICA ECONÔMICA. Boletim DEPE. Pontifícia Univesdidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política. Departamento de Economia. Grupo de Pesquisas sobre Desenvolvimento Econômico e Política Econômica, Ano I, n.1 – Março 2016.
IBGE – INSTITUTO NACIONAL DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Contas Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor: séries históricasDisponível em <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/precos/inpc_ipca/defaultseriesHist.shtm>. Acesso em 20/5/2016.
LACERDA, Antônio Correa. 5 caminhos para frear a inflação. Revista Épooca Negócios . Disponível em: . Acesso em 14/05/2016. 

OCDE - ORGANIZAÇÃO PARA COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Base de dados. Disponível em: . Acesso em: ago. 2015.


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