Abas/ guias

28 de fev. de 2011

Um plano de negócio eficiente ainda é uma condição necessária para o bom planejamento do candidato a empresário

Empreender em um negócio próprio tem se tornado uma eficiente alternativa ao clássico comportamento da massa de trabalhadores no Brasil. Pesquisas apontam que ao conciliar a oportunidade de atuação em mercados promissores com o desejo de ter um negócio próprio, boa parte da oferta da mão-de-obra – que antes lançava nas grandes firmas as suas principais chances de realização – mira agora na abertura de um negócio próprio o alcance do seu sucesso profissional.

De acordo com a pesquisa "12 anos de monitoramento da sobrevivência e mortalidade de empresas", realizada em 2010 pelo Sebrae-SP (Serviço de apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo), com dados da Jucesp (Junta Comercial do Estado de São Paulo), 78% da empresas de uma amostra planejada de 3.000 abertas nos anos de 2003 a 2007 disseram ter aberto a própria empresa pelo motivo oportunidade. Dessas, 33% foram abertas por ex-empregados de empresas privadas, seguidos por 28% de desempregadas e 20% de profissionais autônomos.

Em relação a evolução da taxa de mortalidade das empresas nos últimos anos, a pesquisa apresentou melhora de 8 pontos percentuais para empresas com até um ano de existência, passando a 27% na última pesquisa – com dados de 2007/08 -, ante 35% na pesquisa realizada com dados de 1998/99. No caso das empresas com até dois anos de existência, houve queda de 9 p.p. no índice, 37% ante 46%, respectivamente, enquanto para empresas com até cinco anos de existência a redução foi de 13 p.p., 58% ante 71%.

Novo perfil empreendedor
Outro dado que ganhou destaque na pesquisa foi a evolução da taxa dos empreendimentos abertos por indivíduos com até 24 anos, que passou de 4% em 1995 para 13% em 2007, evidenciando a maior penetração e interesse dos jovens em se lançar nesta empreitada. Na coluna do dia 17/02/11 intitulada "É hora de o jovem empreender e criar o próprio emprego" escrita ao jornal Valor Econômico, Renato Bernhoeft  parte em crítica à busca dos jovens por planos de carreira centrados no emprego convencional. Segundo Bernhoeft, a melhoria do nível de escolaridade da população e a inclusão do acesso aos meios digitais têm demonstrado que o empreendedorismo também pode se tornar um rumo de carreira viável em momentos de forte expansão econômica, e não apenas uma opção marginal a épocas onde há aumento da taxa de desemprego e recessão.

Apesar do perfil arrojado e com propensão maior ao risco, boa parte dos novos empresários ainda enfrenta dificuldades ligadas ao planejamento inicial do seu negócio. Embora os dados apresentados demonstrem evolução e perspectivas positivas ao ambiente empreendedor, a taxa de mortalidade das empresas abertas ainda impressiona. Ademais, não é possível desconsiderar a provável correlação das principais variáveis macroeconômicas no período para incorporar esta evolução, sobretudo a taxa de desemprego medida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) – que atingiu a histórica marca de 5,3% nas regiões metropolitanas do Brasil, em dezembro de 2010 – cujo patamar é digno do nível em que os pensadores clássicos consideravam haver "pleno emprego" na economia.

O caso dos restaurantes de São Paulo ilustra esta situação. A taxa de mortalidade para o setor no estado atingiu 70% dos empreendimentos com até dois anos de existência, quase o dobro da média no estado (37%), segundo os dados apresentados pela Abrasel-SP (Associação de Bares e Restaurantes de São Paulo) na matéria "70% dos restaurantes de SP não sobrevivem ao 2º ano", publicada na Folha de São Paulo em 27/02/2011. De acordo com a matéria, os maiores desafios para a sobrevivência da empresa são: "acertar na contratação da equipe, encontrar um endereço com preço acessível e segurar as contas enquanto o retorno do investimento não chega".

O plano de negócios
Seja qual for o nível de especialização do empreendedor e do futuro empreendimento, uma coisa é certa, um planejamento eficiente é uma tarefa necessária para a saúde de um bom negócio nos últimos anos. O plano de negócios, também conhecido como business plan, no termo em inglês, passou a ser, igualmente, um importante aliado do empresário para prever obstáculos e mudanças nos rumos na economia ou no ramo em que atua.

De modo geral, entende-se por plano de negócios o documento pelo qual o empreendedor formaliza os estudos a respeito das suas idéias, transformando-as num negócio. Além das informações e conceitos sobre o negócio em que se pretende atuar, o plano de negócios também considera a análise sobre os possíveis riscos inerentes ao ramo da atividade em questão, os seus concorrentes e o perfil da clientela, as estratégias de marketing, bem como o plano financeiro que a viabilizará.

Além de ser uma ferramenta indispensável à minimização do risco, outra importante função do plano é facilitar a aquisição do capital inicial necessário a abertura da empresa. Através da argumentação da venda baseada no valor futuro do negócio esperado, trazido a valor presente, o plano possibilita que o empreendedor busque um investidor para capitalizá-lo, sócio ou banco comercial, à medida que o seu negócio se desenvolva no papel.

Armadilhas
Como o ser humano tende a pôr no papel tudo o que quer, apesar dos benefícios listados, o plano de negócios também pode se constituir numa armadilha a muitos empreendedores desavisados. A empolgação, paixão e contágio da idéia inicial, a falta do conhecimento preciso sobre o ramo, a localidade de atuação e os atores envolvidos no mercado, bem como as incertezas sobre o ambiente macroeconômico e o otimismo exacerbado sobre as fontes e o crescimento da receita do negócio ao longo do tempo são algumas das causas mais comuns para o fracasso de muitos deles.

No trabalho intitulado "Por que os planos de negócios fracassam?", de Cristine Z. P. Rosa, publicado em 2005 pela Escola de Administração da FGV-SP, a autora alerta aos riscos do plano de negócios, sobretudo quando afeiçoados do caráter enigmático do ser humano. Rosa afirma que "Business Plans de sucesso não são aqueles recheados de números otimistas que apontam para empreendimentos de suposto sucesso (...) pois o sucesso de um plano de negócios pode ser aquele que alertou seu empreendedor a não prosseguir [no negócio]".

Precisão X Exatidão
Apesar da precisão e consistência necessárias à elaboração de um plano de negócios, é improvável que a ferramenta obtenha com exatidão a abrangência de todo o conjunto de variáveis que impactam o sucesso do futuro empreendimento. Outras tantas, afinal, nem mesmo costumam ser consideradas, como as voltadas à perspectiva da satisfação dos clientes e dos trabalhadores, da comunidade e da biodiversidade local - que tem sido, por sua vez, alvo de estudo dos chamados planos de negócios sociais, elaborados por empresas como a Artemisia. 

Mais importante do que elaborar um plano de negócio, ter cautela e precisão na sua análise é uma condição fundamental ao planejamento do candidado a empresário. Nestas circunstâncias, embora o plano de negócio seja uma importante ferramenta microeconômica de contribuição ao planejamento empresarial e estímulo à redução da mortandade dos empreendimentos no Brasil, o seu uso indevido tende a mascarar todo o custo da oportunidade de um projeto aparentemente promissor, tornando-se uma verdadeira armadilha ao empreendedor. O plano de negócio quando considerado corretamente, a partir de um processo contínuo que passa pela análise de diferentes pessoas com visão sistêmica, pode se tornar não apenas uma ferramenta para levar ao sucesso do negócio em si mas, sobretudo, um importante referencial sobre o correto hábito de planejar as ações, contribuindo para o surgimento e  longevidade das novas empresas na sociedade.

5 de fev. de 2011

Capitalismo artístico-cultural, a dialética entre o conhecer e o saber e o mal-estar na civilização

O sistema capitalista é compreendido nas ciências econômicas pelo processo de desapropriação dos meios de produção do seu produtor. Ganhando ênfase a partir da Revolução Industrial Inglesa (1776), logo após a transição Mercantil e da decadência do Sistema Feudal, o novo modo de relação social Capitalista levou a comunidade mundial nascente a uma nova instituição constituída pela divisão de interesses entre capital e trabalho.

Trocando em miúdos, esse rompimento estabeleceu uma nova regra do jogo à organização entre aqueles que detêm e oferecem o seu capital a risco, sendo remunerados pelo mais-trabalho produzido pelo trabalhador, além daquele próprio necessário para recompensá-lo com o seu salário. Para o aprofundamento neste assunto, veja o conceito desenvolvido por Karl Marx sobre mais-valia absoluta e relativa, nas seções III e IV da sua obra "O Capital" (1867).

Segundo Marx, diferentemente dos modos de produção anteriores ao capitalismo, o modo dominado pela lógica do capital se baseia no mais-trabalho do produtor direto. A acumulação do capital, contrário então à servidão ou à escravidão, não seria possível se o trabalho humano gerasse apenas o necessário para a subsistência dos seus produtores diretos. O processo de centralização de capitais trouxe junto a ele outro processo ainda maior, o da concentração de renda, que passou a guiar o comportamento social a partir dos hábitos e padrões de consumo dos detentores de capital.

O processo social da divisão do trabalho capitalista – considerado também um processo natural por Adam Smith, na obra "Riqueza das Nações" (1776) – permitiu com que muito além da própria transferência de mais-trabalho ao capital, houvesse por parte exclusiva do detentor do capital a concentração da Sabedoria necessária para a produção de uma mercadoria, advinda da transferência do Conhecimento dos diversos ofícios autônomos de cada trabalhador, por cujas mãos têm de passar um produto até o acabamento final.

Mais de dois séculos desde então, nos dias de hoje, a possibilidade de indução social do detentor de capital à aquisição e consumo de produtos a ele necessários à complementaridade do seu saber, deu lugar a sua influência por meio da transferência de conhecimentos desagregados constituindo verdades que satisfaçam o seu novo padrão social. Conforme relatou Caio Garrido no seu blog Saindo da Matriz, baseado no filósofo Luiz Felipe Pondé, a sociedade Pós-Moderna vive um Mito pela Busca do Conhecimento como verdade inquestionável à Verdade da Sabedoria".


Através do conhecimento, da ciência e de seus "refratários", a própria Busca se emoldura em uma sensação de eterna falta, pois as coisas vão tomando tal forma que os conteúdos conhecidos abstraídos na busca do conhecimento se tornam incoerentes entre si. A busca pelo conhecimento e o próprio conhecimento em si mesmo, a chamada "Arte pela Arte", incorpora um "playground" interno, é como se fosse uma brincadeira de criança, uma dança com as palavras, com os conceitos.

A Sabedoria parece apresentar um diamagnetismo, isto é, parece repelir um pouco essa tentativa consciente de busca da Verdade pelo Conhecimento. Isso se desenha e é revelado pelo que e por onde as pessoas buscam a obtenção da sabedoria (...) Assim como numa Análise Psicanalítica a mudança só se sustenta por via de uma verdade interna profunda reestabelecida inconscientemente e com uma postura pró-ativa de se sustentar a "evolução".


Esta dialética entre o conhecer e o saber é clara e se torna bastante evidente na contemporaneidade corroborando com o tema que deu origem ao livro de mesmo nome "Mal-estar na Civilização", escrito por Sigmund Freud em meados da década de 1930, e que retrata a sensação de repressão pessoal imposta pela sociedade.

Tomando com base a obra de Freud, a repressão social passa a acontecer à medida que a sociedade é suprimida do seu prazer instintivo, a qual correlaciono ao prazer da sabedoria, composto pela possibilidade de consumir o conhecimento necessário a evolução do seu saber. Estando alienada do meio ao qual pertence e sendo reprimida por um volume de informações vazias que segregam suas possibilidades de aperfeiçoar a sua sabedoria, a sociedade perde aos poucos a sua integridade passando do seu instinto de vida à destruição do meio em que vive tendo, como um dos sintomas, o aumento da sua agressividade em decorrência da insatisfação da sua capacidade de concretização do amor.

Arte & Cultura, 2008 - Marcos Andruchak
 Além das alternativas apontadas por Freud como remédio a esta mazela social, como a desistência do desejo, à fuga da realidade por meio da loucura, ou a criação de um universo íntimo podendo também acarretar no uso de drogas como meio de evasão desse sofrimento, proponho aqui aquilo que denomino como busca pelo capitalismo artístico-cultural, ou seja, a mesma lógica da produção e consumo capitalista do conhecimento, mas a partir de padrões de consumo social que priorizem a qualidade de informações em detrimento da sua quantidade, induzindo à aquisição do objeto artístico e cultural como meio para a valorização do conhecimento em sabedoria e bem-estar social.

Embora idealista, considero ser esta uma importante colaboração ao pensamento social e mais uma evidência dos cuidados necessário a integridade humana. Espero que esta reflexão tenha sido produtiva sabendo que ainda está longe de ser esgotada.