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17 de mar. de 2010

Seminário Economia Verde

No último dia 15 de março de 2010 foi realizado no Auditório do Ibirapuera, em São Paulo, o Seminário Economia Verde. O evento comemorou o aniversário de um ano da agência de fomento Nossa Caixa Desenvolvimento que lançou, com base na Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC - Lei 13.798), uma nova modalidade de financiamento, chamada Linha Economia Verde, destinada às pequenas e médias empresas paulistas que, por meio de processos produtivos menos poluentes, se comprometerem a reduzir a emissão dos gases causadores do efeito estufa. Aprovada em 2009 pelo governo do estado de São Paulo, a PEMC prevê a meta para redução de 20% de gases de efeito estufa na região até 2020.

O evento foi dividido em duas partes. A primeira contou com a conferência do Professor Ignacy Sachs, que destacou a necessidade de pensar simultaneamente à defesa do meio ambiente e da sociedade como meio para o desenvolvimento mundial durante o terceiro estágio da transição terrestre que está em curso.
A segunda parte contou com a participação de alguns especialistas que apontaram para os desafios e às possíveis soluções para enfrentar as dificuldades da crise ambiental que se propaga no mundo. Ignacy Sachs é economista especialista na área das ciências sociais. Diretor do Centro de Pesquisas do Brasil Contemporâneo na Escola de Altos Estudos de Ciências Sociais, em Paris. É o cvriador um dos criadores do conceito ecosocioeconomia.

Segue abaixo os principais trechos da palestra do Professor Sachs que, inicialmente, parabenizou o estado de São Paulo por representar a vanguarda do debate mundial sobre como fazer coisas que permitam reduzir os impactos ambientais e, ao mesmo tempo, avançar nos problemas sociais.

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No início do século XXI o mundo enfrenta dois grandes desafios que não se resumem apenas à questão do meio ambiente, mas também ao seu enorme passivo social. Por isso já é hora de a sociedade parar de pensar nos velhos paradigmas do socialismo real – cujo marco da decadência foi em 1989 com a queda do muro de Berlim – e do mito dos mercados que se alto regulam, o laissez faire – que se mostrou esgotado a partir da crise financeira mundial iniciada em 2008 cujo marco foi a quebra do banco de investimentos Lehman Bothers.

A obrigação da sociedade neste momento é pensar, portanto, como estes dois desafios podem ser enfrentados simultaneamente. Neste contexto convêm avaliar a iniciativa da Nossa Caixa Desenvolvimento de gerar novas linhas de crédito não só para mitigar a emissão dos gases de efeito estufa, como também para gerar condições de trabalho decentes à população – através da remuneração da força de trabalho de forma digna, de acordo com a situação de cada economia e demais elementos qualitativos.

A sociedade vive um momento bastante excepcional, pois não só enfrenta a crise financeira, como também a crise ambiental e o modelo da globalização. Isso leva a repensar as estratégias de desenvolvimento tomando como ponto de partida o pensamento do argentino Aldo Ferrer e do chileno Osvando Sunkel. Não se trata de propor a autarquia, mas de repensar soluções a partir daquilo que existe ao alcance das mãos, ao redor, lembrando que esta crise ambiental é um assunto especial.

O mundo está entrando no começo da terceira grande transição da evolução da espécie humana. Há cerca de doze mil anos houve a primeira, a neolítica, marcada pela domesticação das espécies vegetais e animais, a sedentarizarão das tribos e o primórdio da civilização. A segunda foi em meados do século XVIII a partir da utilização das energias fosseis e das revoluções industriais que se seguiram.

Hoje, no início do século XXI, a explosão da população humana no planeta e as mudanças climáticas que o ameaçam são o início da terceira grande transição. Por isso é necessário que a sociedade dê conta de atacar simultaneamente a crise ambiental, financeira e repensar o conceito da economia global, que se caracteriza neste momento pelo uso de transportes pouco úteis e por um grupo de países que se beneficiam ao custo do prejuízo de outros.

Para onde queremos ir afinal? Onde estão as margens de liberdade que a sociedade enfrenta hoje? Para este novo curso é necessário, em primeiro lugar, que as redes universais de serviços sociais (educação, saúde, saneamento, habitação popular) sejam garantidas a partir da possibilidade de um estado desenvolvimentista livre da ação do mercado.

Em segundo, é preciso que haja ampliação do perímetro daquilo que no Brasil se conhece como economia solidária e que na Europa se chama economia social. Autarquias, empresas para-estatais, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), dentre outras que não se regem pela apropriação privada do lucro devem ter um perímetro maior de atuação segundo as políticas a que se aplicam.

Finalmente, a terceira condição necessária para enfrentar este desafio é a construção de uma economia verde. Ela deve ser capaz de reduzir os impactos ambientais e os gases do efeito estufa - que ameaçam uma mudança climática irreversível e deletéria - conjugada com o maior número de oportunidades de trabalhos descentes.

O paradigma enérgico é um elemento central nesta produção. Não se trata apenas da troca de energias fósseis por energias limpas e renováveis, mas, sobretudo pela alteração do seu padrão de consumo, através da maior sobriedade da população. Isso significa mexer com os estilos de vida, como o uso dos meios de transportes, dentre outros que possam ser mais ou menos necessários ao cotidiano.

Na França, por exemplo, Sachs diz poder atravessar um inverno europeu sem o consumo de cerejas, mesmo sabendo da possibilidade de importá-las do Chile, para que haja economia de recursos. Este é um exemplo que pode ser facilmente generalizado. É necessário, portanto, que a sociedade pense na questão da eficiência energética como forma de aprimorar e substituir o seu uso, através da substituição das energias fósseis pelas renováveis, como eólica, dos mares, e a bioenergia.

Países tropicais, como o Brasil, são particularmente beneficiados pelo clima, pelas “terras da boa esperança”, que estão predestinadas a construir as “biocivilizações do futuro”. A biomassa é, afinal, alimento humano, ração para animais e adubo para plantações. Trata-se do mundo que está por ser conquistado. Nessa direção convêm reestruturar a economia para uma economia verde que aproveite ao máximo estes recursos renováveis, gerando um grande número de empregos.

Para avançar nesta direção cuja iniciativa do governo de São Paulo – através da Política Estadual de Mudanças Climáticas (PEMC) - é pioneira, convêm pensar a questão do ordenamento do planejamento, que atualmente vive uma clara contradição. A Escola do planejamento surgiu no século XX, na União Soviética, que tinha como único instrumento técnico à mão o ábaco . Hoje, paradoxalmente, a sociedade dispõe de computadores que multiplicam as possibilidades técnicas para o planejamento, mas não os utiliza de forma eficiente.

O planejamento está desmoralizado e poucas universidades o ensinam. Não se trata do planejamento que busque um novo regime, mas aquele que considere o regime democrático quadripartite formado por Estado, empresas, trabalhadores, e a sociedade civil organizada a fim de que se busque um diálogo permanente. Novos conceitos e padrões de desempenho também são necessários, como a pegada ecológica, a biocapacidade e o trabalho decente. A partir desses conceitos e através deste diálogo quadripartite é que convêm elaborar estratégias para o futuro que agregue, simultaneamente, os aspectos ambientais e sociais.

Em 2012 o Brasil será pela segunda vez o palco de uma conferencia mundial das Nações Unidas ecoando as duas anteriores, a de Estocolmo, em 1972 e a do Rio de Janeiro, em 1992. A nova Cúpula da Terra de 2012 terá o nome de Conferência do Desenvolvimento e do Meio Ambiente. Isso quer dizer que o mundo precisa de um desenvolvimento que considere o meio ambiente como dimensão e não como objeto atrelado a uma política pública.

Esta condição requer da sociedade quadripartite um grande esforço para chegar nesta nova conferência com propostas. A Agência Brasileira de Instituições Financeiras de Desenvolvimento (ABDE) poderia fomentar estas idéias, a partir da multiplicação das experiências do estado de São Paulo para o Brasil e, a partir daí, para um plano mundial.

Apesar das dificuldades da negociação recente em Copenhagen (COP-15), todos os países integrantes da Organização das Nações Unidas (ONU) se comprometeram a fazer planos de desenvolvimento includente. Este plano tem como base a estratégia mundial de compatibilizar planos e sinergias nacionais de longo prazo baseados no duplo conceito de inclusão social e sustentabilidade tecnológica.

Chegou o momento do Brasil trabalhar o seu plano de desenvolvimento para uma perspectiva de quinze anos, que ao mesmo tempo é suficientemente longa para trabalhar transformações e suficientemente curta para não cair em devaneios.

O Seminário Economia Verde é o primeiro passo nesta direção e o estado de São Paulo está se mostrando pioneiro em propor soluções baseadas na inclusão social e sustentabilidade tecnológica. Ao longo deste caminho será possível verificar como é a transição entre o abstrato e o concreto. A partir do intercâmbio de idéias com outros estados será possível iniciar também trocas internacionais em busca a superação dos desafios esperados à frente.

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No mesmo evento, o doutor em Ciências Físicas pela Universidade de São Paulo, José Goldemberg, também professor titular do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, apresentou algusn dados do seu mais recente estudo “A política estadual de mudanças climáticas: um caminho para a Economia Verde”

De acordo com Goldemberg (Gráfico no. 1), o fornecimento de energia – em grande parte representada pela produção de energias fósseis -- é o principal responsável pelos gases de efeito estufa no mundo, representando 26% do total de emissões, seguido pelo setor industrial (20%), desmatamento (17%), transportes (13%) – no qual se considerou rodoviário, ferroviário e aéreo – e as residências (13%).

A análise dos mesmos dados para o Brasil demonstra que o setor de transporte é o líder de emissões no país, com 40% do ônus total. Trata-se do efeito gerado pelo excessivo transporte de mercadorias e pessoas feito por caminhões e automóveis. Em seguida ficaram o setor industrial (31%), o energético (17%) – que se beneficia da sua matriz limpa da qual fazem parte a energia hidrelétrica e o álcool -, setor residencial (5%) e comercial (1%).

Já no estado de São Paulo, os dados apresentados mostram que a situação para o setor de transportes se agrava ainda mais, cujas emissões representam 56% dos poluentes emitidos à atmosfera. A indústria (30%) foi a segunda do ranking, seguida por residências (6%) e o setor agropecuário (3%).

Segundo os dados de Goldemberg, a situação dos transportes é ainda mais caótica para a cidade de São Paulo registrando 78% das emissões de poluentes no município, ante 10% das residências e 7% das indústrias.

Existem, portanto, inúmeras oportunidades para que as emissões de gases nocivos ao meio ambiente sejam reduzidas. É importante que as linhas de financiamento se concentrem naquelas atividades mais poluentes. Há países, por exemplo, que pagam para que as pessoas substituam carros velhos por carros novos.

Não apenas para benefício do meio ambiente, a necessidade da redução de poluentes também está voltada à melhoria da competitividade das empresas. São Paulo fixou uma meta audaciosa, e isso irá preparar o espaço público para tratar das possíveis resoluções para a crise ambiental por meio das negociações junto aos empresários.

Apesar de importantes, as linhas de crédito para a economia de baixo carbono só se tornarão um fator de competitividade para o país se forem realizados investidos em novas energias e tecnologias. Os centros de excelência do Brasil padecem de pouco investimento. A Linha Economia Verde do fundo Nossa Caixa Desenvolvimento daria grande exemplo para o resto do país se, portanto, também fomentasse esses grandes centros científicos.

Até a próxima

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