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10 de abr. de 2016

Epigenética: limites da pré-disposição gênica na área da Saúde

Quais são os fatores que permitem a um indivíduo ter melhor rendimento físico que outro? Segundo cientistas entrevistados pelo Jornal Globo Esporte, em 2012, o diferencial reside na estrutura do DNA humano, especialmente no que diz respeito aos cerca de 300 dos 30 mil genes humanos que têm associação direta com o desempenho esportivo. Tais genes levam, por exemplo, à respostas relacionadas ao bombeamento de sangue durante a atividade física, ou tipo de musculatura que será desenvolvida em uma prática esportiva.

Para Rodrigo Gonçalves Dias, pesquisador do Instituto do Coração de São Paulo, “um atleta de elite não consegue chegar ao topo [do esporte] se ele não tiver uma bagagem genética extremamente favorável”. Bastaria neste caso que fosse mapeado o DNA de grandes atletas para identificar qual o tipo perfeito de DNA relacionado a cada modalidade, oferecendo indícios sobre qual modalidade cada novo indivíduo teria mais aptidão a praticar ao longo de sua vida. Mas será só isso?

            Segundo outra reportagem da Revista Veja feita em 2013 sobre o assunto, o melhor rendimento físico não decorre apenas da existência de determinados genes a ele associados, mas dos próprios hábitos de vida de uma pessoa, como a prática diária de atividades físicas, que pode alterar a pré-disposição de certos genes, por exemplo, em acumular mais ou menos gordura no corpo. Tal fato levou à contestação da ideia de que os genes, por si só, respondiam pelos segredos da vida, a exemplo da determinação pela aptidão física de uma pessoa e sua ligação com o esporte.

            Tais argumentos consistem da epigenética, área que estuda as “mudanças hereditárias na expressão gênica que independem de mudanças na sequência primária do DNA” (MOLOGNONI, online), ou ainda, “aquilo que está acima da genética” (SCIENCE NORDIC, online). Para a epigenética, o DNA humano é realmente responsável por ditar alguns comportamentos e características físicas do corpo, como a cor da pele, tipo de cabelo ou cor dos olhos. Contudo, aponta que o DNA não é um manual perfeito para explicar alguns fenômenos humanos, como se imaginava, já que alguns genes, os chamados epigenes, podem ser modificados de forma branda pelo modo e hábitos de vida adotados por seres-humanos.

Os epigenes podem ser diretamente afetados, assim, por reações químicas associadas à determinados hábitos de vida, que os ativam ou desativam, ajustando o quão forte ou fraca será a expressão desses genes. Para Miriam Galvonas Jasiulionis, pesquisadora do Departamento de farmacologia da Universidade Paulista de Medicina (Unifesp), “os epigenes permitem que o genoma converse com o meio ambiente” (JASIULIONIS, online), derivando daí que o fenótipo humano decorre do epigenótipo, isto é, do genótipo modificado por marcas epigênicas ligadas a fatores do meio. Em teoria, “isto significa que pode existir um par idêntico de clones com o mesmo DNA, mas que podem agir de forma muito diferente um do outro” (SCIENCE NORDIC, online).

Os estudos de epigenética reabriram, dessa forma, a discussão iniciada no século XIX que contrapões as ideias de Jean Baptiste Lamarck (1744-1829) e Charles Darwin (1809-1882) sobre a teorias da evolução das espécies. Segundo Lamarck, a progressão dos organismos dependia do meio ambiente, fazendo com que eles se adaptem para conseguir sobreviver. Já Darwin considerava que organismos mais bem adaptados ao meio ambiente tinham maiores chances de sobreviver, levando a uma melhor adaptação dos seus descendentes ao meio que viviam. Apesar da aceitação das ideias de Darwin até os dias de hoje, os estudos de epigenética comprovaram que as ideias de Lamarck também estavam corretas, já que os hábitos do dia a dia modificam a ação de alguns genes no organismo, os chamados epigenes.

Para a pesquisadora da Faculdade de Medicina da Universidade de Oslo, Ellen Wikenius, “a epigenética nos traz esperança, porque oferece um olhar além do ponto de vista determinista de que ‘estes são seus genes, então, é isto que você se tornará’”. A pesquisadora considera, contudo, que embora se saiba que certos genes humanos possam ser ativados ou desativados, por exemplo, através do carinho oferecido ou não pela mãe ao seu filho, ou pelo som que um feto escuta desde a barriga da sua mãe, ainda há muitos pontos desconhecidos na área da epigenética para que seu o conhecimento seja levado ao tratamento de determinadas doenças para saúde humana. Será que algum dia a epigenética terá capacidade de identificar como atletas sem pré-disposição gênica podem se tornar campeões?

Bibliografia:
ESPORTE ESPETACULAR. Pesquisa genética busca aumentar o desempenho dos atletas (vídeo). Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=0-ujrPppN3o&app=desktop>. Acesso em 03/04/2016.
JASIULIONIS, Miriam Galvonas. Epigenetics. Simpósio Internacional Integração Corpo-Mente-Meio. Escola Paulista de Medicina – UNIFESP. Disponível em <http://www.fapesp.br/eventos/2013/03/CMM/Jasiulionis.pdf>. Acesso em 03/04/2016.
MOLOGNONI, Fernanda. Epigenética. Escola Paulista de Medicina – UNIFESP. Disponível em <http://www.ime.usp.br/posbioinfo/cv2012/epigenetica_FernandaMolognoni.pdf>. Acesso em 03/04/2016.  
SCIENCE NORDIC. What exactely is epigenetics? Disponível em <http://sciencenordic.com/video-what-exactly-epigenetics>. Acesso em 03/04/2016.
SÓ BIOLOGIA. A teoria de Darwin. Disponível em <http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Seresvivos/Ciencias/bioselecaonatural2.php>. Acesso em 03/04/2016.
__________________. As ideias de Lamarck. Disponível em <http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Evolucao/evolucao14.php>. Acesso em 03/04/2016.

VEJAPONTOCOM. Genética dos genes (vídeo). Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=F8UuqLL-2FU>. Acesso em 03/04/2016. 

3 de abr. de 2016

Mlécula ALDA-1: há cura para doenças degenerativas

             Quem já não fez uma brincadeira com algum amigo asiático quando esse ingeriu alguns copos de cerveja e, sem conseguir disfarçar, ficou com o rosto todo vermelho, parecendo um pimentão? Tal condição, denominada “síndrome asiática do rubor facial induzida pelo álcool”, que segundo os dados do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA) acomete 40% da população descendente do Leste Asiático, consiste na mutação da enzima chamada aldeído-desidrogenase 2 (ALDH2), responsável por catalisar o álcool no organismo dos seres-humanos, através da oxidação do acetoaldeído (substância tóxica resultante da metabolização do etanol) para acetato.

            Segundo a revista Nature Structural & Molecular Biology, que em 2010 publicou artigo sobre o tema, a ALDH2 corresponde a uma enzima mitocondrial que metaboliza diferentes tipos de aldeídos tóxicos, e também ativa a reação da nitroglicerina. Contanto, a revista afirma que a enzima é mais largamente conhecida por sua atividade metabólica relacionada ao etanol. A partir da mutação da enzima ALDH2, que acaba por gerar sua variante inativa, denominada ALDH2*2, indivíduos com essa característica costumam reter e ter maior acúmulo de acetaldeído no sangue mesmo após a ingestão de uma única dose de bebida alcoólica.

            De acordo com o mesmo artigo, pesquisadores norte-americanos descobriram a existência de uma nova molécula, chamada Alda-1, que entre suas principais funções está a de “reativar” a molécula ALDH2*2, contribuindo com o aumento da eficiência da interação enzima-substrato, neste caso entre o ALDH2*2 e o álcool, e na restauração da propriedade catalítica dessa enzima. Com essa descoberta, acredita-se ser possível que também se descubra novas fórmulas farmacológicas destinadas a diminuir o risco de que indivíduos com essas características, seja ela a “síndrome asiática”, envolvendo menor risco para a saúde, como doenças graves, entre elas doença de Alzheimer, de caráter neurodegenerativas.

Reportagem da Revista Exame publicada em 2015 revela, da mesma forma, que pesquisadores da Universidade de Stanford, em parceria com pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da USP (ICB-USP), desenvolveram um tratamento a partir do composto Alda-1, testado apenas em ratos, que diminuiu quase que pela metade a perda da função cardíaca em indivíduos infartados. Segundo a reportagem, quanto maior era o nível de aldeídos no sangue, menor era a função cardíaca dos indivíduos infartados, o que sugere que a enzima ALDH2 não estava funcionando adequadamente antes do uso do composto Alda-1.

Seja para reduzir a vermelhidão no rosto de descendentes do Leste Asiático, mas principalmente para reter o avanço de diversas doenças crônico-degenerativas, com no caso do Alzheimer, bem como para a melhoria de funções cardíacas nos indivíduos, entre outros, não resta dúvidas sobre a importância do descobrimento e dos avanços científicos relacionados com a descoberta de fórmulas farmacológicas baseadas na molécula Alda-1.

Bibliografia:
CISA – CENTRO DE INFORMAÇÕES SOBRE SAÚDE E ÁLCOOL. Descoberta a molécula Alda 1 responsável pela reativação da enzima aldeído desidrogenase 2 envolvida no processo. Disponível em <http://www.cisa.org.br/artigo/449/descoberta-molecula-alda-1-responsavel-pela.php>. Acesso em 12/03/2016.
EXAME. Remédio desenvolvido pela USP reduz degeneração cardíaca após o infarto. Disponível em <http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/remedio-desenvolvido-pela-usp-reduz-degeneracao-cardiaca-apos-o-infarto>. Acesso em 12/03/2016.
PEREZ-MILLER, S. et al. Alda-1 is an agonist and chemical chaperone for the common human aldehyde dehydrogenase 2 variant. Disponível em <http://www.nature.com/nsmb/journal/v17/n2/full/nsmb.1737.html>. Acesso em 12/03/2016.